Na reabertura dos trabalhos legislativos, o Congresso Nacional deve analisar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 358/05, que cuida da segunda etapa da Reforma do Judiciário. A primeira fase da reformulação do sistema judicial resultou na Emenda Constitucional 45/2004.
Ainda não há consenso dos líderes sobre o texto final. Dois substitutivos estão prontos para votação. Um apresentado pelo relator, o dep. Paes Landim e outro aprovado numa comissão especial, que era presidida pelo dep. Átila Lins. Ambos prevêem alterações em vários artigos da Constituição e pretendem acrescer-lhe outros tantos dispositivos. Analisarei apenas as mudanças que, nos dois substitutivos, têm reflexo, direto ou indireto, na Justiça criminal e no combate à corrupção:
- Foro privilegiado criminal: o foro especial por prerrogativa de função persistirá mesmo após findo o exercício do cargo ou mandato do réu (art. 97-A da CF). A ação penal deverá ser proposta perante o tribunal com competência originária. Com isso, haverá o retorno ao sistema instituído pela extinta Súmula 394 do STF. De certo modo, esse sistema é melhor que o atual pois “perpetua a jurisdição” e evita casos de clara chicana como o da renúncia do deputado Ronaldo Cunha Lima, que respondia no STF por tentativa de homicídio.
- Foro privilegiado na improbidade administrativa: pessoas suspeitas de atos de improbidade previstos na Lei 8.429/92 deverão ser processadas perante o tribunal que as julgaria em caso de crime (art. 97-A, único). Os juízes de primeira instância com competência cível não poderão mais julgar tais autoridades. Trata-se de um flagrante retrocesso.
- Composição do CNJ: o Conselho Nacional de Justiça passará a ter um membro a mais (art. 103-B, III-A). Serão 16 conselheiros, abrindo-se uma vaga para ministro do Superior Tribunal Militar (STM), até agora não representado. Com isso, em lugar de se extinguir a Justiça Militar, faz-se um “puxadinho” para o STM no órgão de controle externo do Judiciário.
- Presidência do CNJ: como na prática já acontece, o Conselho Nacional de Justiça será sempre presidido pelo presidente do STF, considerado membro nato (art. 103-B, §§1º e 2º). Nenhuma novidade.
- Defensoria Pública: A União deixa de ter competência para organizar e manter a Defensoria Pública do Distrito Federal (art. 21, XIII; 22, XVII, 48, IX, CF). A tarefa passa ao Distrito Federal. Haverá economia para a União. Perdeu-se a oportunidade de também reformular o Ministério Público da União (MPU), transformando um de seus ramos, o Ministério Público do Distrito Federal (MPDF), em órgão daquela unidade federativa.
- Vitaliciedade: juízes e membros do Ministério Público só alcançarão a vitaliciedade após três anos de exercício nos cargos, e não ao fim do biênio, como ocorre atualmente. Nesse período, chamado estágio probatório, juízes, promotores e procuradores podem ser demitidos mais facilmente (art. 95, I; 128, V, I, ‘a’).
- Nepotismo: a proposta proíbe o nepotismo no Poder Judiciário e no Ministério Público, prática ímproba que na prática já vem sendo combatida pelo CNJ e pelo CNMP. Nada novo aqui (art. 93, XVI).
- Súmulas impeditivas de recursos: o Superior Tribunal de Justiça (STJ) poderá editar de ofício ou por provocação, após reiteradas decisões sobre a matéria, súmula que impedirá a interposição de quaisquer recursos contra a decisão que a houver aplicado (art. 105-A). O mecanismo é semelhante ao das súmulas vinculantes do STF e pode acelerar a tramitação de processos e o trânsito em julgada das decisões, inclusive as criminais.
- Sanções para juízes e membros do MP: poderão perder o cargo por decisão judicial em caso de negligência, desídia, falta de decoro, envolvimento em política partidária, corrupção, cumulação não permitida de cargos públicos ou quebra da quarentena (art. 95, I, ‘a’, ‘b’ e ‘c’; 128, §5º, I, ‘a’). Isto é bom.
- Nomenclatura dos cargos judiciários: os juízes dos Tribunais Regionais Federais e do Trabalho agora serão chamados oficialmente de “desembargadores” (art. 104, único, I; 107; 115). Essa denominação já foi adotada por todos os TRF. Puro verniz.
- Nomenclatura dos cargos do Ministério Público: os membros do Ministério Público dos Estados e do Distrito Federal serão chamados apenas de “promotores de Justiça”. Deixa de existir a denominação “procurador de Justiça”. Os procuradores-gerais, chefes da instituição, receberão o nome de promotores-Gerais de Justiça (art. 129, §§6º e 7º). Não haverá alteração em relação aos cargos do Ministério Público Federal. Então o problema de identidade continua.
- Polícia dos tribunais: os tribunais poderão organizar seus serviços de polícia. Não está claro se esse órgão se encarregará apenas da segurança das instalações judiciárias e dos juízes, ou se abarcará também a atividade de investigação de ilícitos ocorridos nos prédios judiciários (art. 96, I, ‘b’).
- Competência criminal do STF: o STF passa a ser competente para julgar, nas infrações penais comuns, os membros do CNJ e do CNMP (art. 102, I, ‘b’). A EC 45/2004, que criou os dois órgãos, não adotou essa prosaica providência.
- Competência criminal do STJ: os membros do Ministério Público dos Estados e do Distrito Federal que atuam perante tribunais também serão julgados pelo STJ (art. 105, I, ‘a’), como já acontece com os membros do MPU na mesma situação. Assim os membros do MP em segundo grau serão julgados nas causas criminais pelo STJ, tal como os desembargadores.
- Vedações para membros do CNJ e CNMP: os conselheiros de controle externo não poderão exercer a advocacia em qualquer parte do país, nem envolver-se em atividades político-partidárias nem exercer outro cargo ou função, salvo uma de magistério. Essas proibições são moralizantes e são bem-vindas (art. 103-B, §7º; 130-A, §6º).
- Composição do STM: o STM deixa de ter quinze ministros. O pleno será reduzido a onze juízes e aumentará a proporção de ministros togados. Haverá sete ministros militares e quatro ministros civis. Dois destes serão oriundos da carreira da magistratura. Atualmente há dez militares e cinco civis, sendo que apenas um deles é juiz de carreira (art. 123).
- Competência da JMU: a Justiça Militar da União, cuja competência é restrita a matéria criminal, passa também a exercer o controle jurisdicional sobre punições disciplinares aplicadas aos membros das Forças Armadas (art. 124). Hoje esta competência é da Justiça Federal.
- Composição dos TRE: os dois advogados que compõem os Tribunais Regionais Eleitorais serão nomeados pelo presidente da República a partir de duas listas tríplices distintas, elaboradas pelo Tribunal Superior Eleitoral. A escolha não será mais dos Tribunais de Justiça. Além disso, os TRE passarão a ter nove juízes, e não sete como hoje. A ampliação resultará da inclusão de outros dois magistrados federais, que, se forem desembargadores de TRF, poderão presidir o colegiado (art. 120, II e III e §2º). Hoje a presidência dos TRE cabe apenas aos desembargadores dos TJ.
- Gratificação eleitoral: um dos substitutivos prevê o fim da gratificação mensal que é paga pela União a membros do Judiciário e do Ministério Público que atuam perante a Justiça Eleitoral (art. 121, §5º).
- Chefia do MPU: o Procurador-Geral da República passa a ser escolhido apenas entre membros do Ministério Público Federal (MPF), o que na prática já vem ocorrendo. Embora só integrantes do MPF cheguem a PGR, teoricamente, membros do MPT, MPM e MPDFT, que são ramos do MPU, também poderiam ser escolhidos. Além disso, fica permitida apenas uma recondução ao cargo de PGR. Atualmente, não há limitação (art. 128, §1º).
A redação original da PEC 358/05, que cedeu lugar aos substitutivos, previa ainda:
- Ampliação da competência cível originária do STF: o STF passaria a ser competente para julgar originariamente as ações populares e as ações civis públicas contra atos dos presidentes da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do Senado e do próprio STF. Tal alteração seria terrível por dificultar a tutela da probidade na Administração.
- Ampliação da competência cível originária do STJ: o STJ passa a ser competente para julgar originariamente as ações populares e as ações civis públicas contra atos dos Ministros de Estado, dos Comandantes do Exército, da Marinha ou da Aeronáutica, ou do próprio STJ. Mudança assim seria reprovável.
- Composição do STJ: dois terços dos ministros do Superior Tribunal de Justiça seriam escolhidos pelo presidente da República entre desembargadores dos TRF e dos TJ, oriundos da carreira da magistratura. Estariam excluídos os desembargadores do quinto constitucional. O terço restante das vagas do STJ continuaria reservado, em partes iguais, a membros do MP e advogados. Esta é uma disputa corporativa da magistratura de carreira, que queria reserva de vagas para juízes “puros”, excluindo os do quinto no acesso ao STJ nas vagas do Judiciário.
Minha opinião: como se percebe, a maior parte das alterações propostas pela PEC-358/05 é meramente cosmética. Temo que não resolverão o que é efetivamente importante: a qualidade e a prontidão da prestação jurisdicional. A lentidão da Justiça é um tormento para milhões de brasileiros. Salvo a súmula impeditiva de recursos, o “reboco” que agora propõem não vai acelerar os processos da população. Na verdade, tirando o fortalecimento da Defensoria Pública e a criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), nem a 1ª Reforma do Judiciário de 2004 foi para valer. Passaram uma demão de tinta na Justiça aqui e ali. Reforma mesmo só nos prédios. O resto continua igual.
O Brasil é o país do verdadeiro coronelismo, pois uma pessoa que tenha dinheiro, ou influência política ou cargo público importante é que manda, desmanda e faz o que bem entende nesta Nação. Veja o fato de os juízes dos TRFs e TRTs que já se intitularam desembargadores, mesmo sem haver qualquer legislação criando o cargo!
Por outro lado, um oficial de Justiça da União foi transformado em analista judiciário – especialidade execução de mandados.
Um agente de segurança do Judiciário da União, ainda nem sabe o que ele é realmente, se é um técnico judiciário – especialidade segurança, ou se ainda é agente de segurança judiciária. Porém, jamais poderia se intitular agente federal ou polícia judicial federal, pois deve ser sempre um servidor insignificante e pau mandado de magistrados. E nem mesmo poderia adotar a nomenclatura, tal como fizeram os chamados desembargadores federais dos TRFs e agora também os desembargadores federais do trabalho e já temos até juízes do trabalho se intitulando: ” juiz federal do trabalho”.
É muita arrogância, excesso de poder, vaidade aos extremos e manipulação da coisa pública como se fosse bem privado!
Em relação aos ex-agentes de segurança do Parlamento Federal, por pura cumplicidade, os donos do Poder através de ato legislativo, criaram o cargo de Polícia Legislativa Federal, bem como valorizaram as atribuições, salários e porte de arma. E esse mesmo Legislativo federal, ainda escolheu a quem prestigiar com o porte federal de arma de fogo, basta ler o Estatuto do Desarmamento. Enquanto isso, um agente de segurança do Judiciário da União, precisa bajular magistrados, a fim de tentar conseguir um título precário de autorização de porte de arma, que será fornecido pela Polícia Federal. E os demais colegas que não nasceram com vocação para bajulação, precisam ficar apenas com um colete de pano, desarmados realizando segurança do Poder Judiciário da União, inclusive procedendo ao acautelamento de arma de fogo, mesmo sem ter a devida autorização de porte de arma de fogo; um verdadeiro absurdo, pois no mínimo estariam praticando crime de porte ilegal de arma de fogo dentro do Poder Judiciário da União.
Esse é o desabafo de um agente que ingressou no judiciário federal um pouco depois da criação dos TRFs, fez um concurso público bem disputado, já tendo passado pela Segurança Pública e Forças Armadas, mediante concurso público e hoje não pode nem mesmo usar o revólver calibre 38 e uma pistola 380, e que foram comprados legalmente na época que pertencia a corporação da Polícia Civil, bem como ainda possui, por burocracia do SINARM o registro provisório das referidas armas.
E como nunca concordei com a covardia que fizeram com um grande número de colegas que já foram policiais ou militares e tiveram muito mais treinamento que um policial de hoje em dia, mas mesmo assim, ficaram de fora do rol de pessoas autorizadas ao porte de arma, ainda que estejam lotados em órgãos públicos importantes. E caso queiram um porte de arma, então, precisam pagar taxa de registro na Polícia Federal, aliás, todos precisam pagar novamente, ainda que não queiram o porte, (um absurdo jurídico), pagar exame psicológico (outro absurdo), pois o policial em situação de atividade só faz um exame psicológico para ingressar na corporação civil ou militar, salvo se ficar doente. Mas a lei nos deixou todos como possíveis doentes. Tendo em vista a renovação de tudo quanto é exame e pagamento de taxas, tarifas e etc. A fim de realizar novo curso de tiros ( outro absurdo ), pois existem corporações policias militares ou civil, cujos membros nunca estiveram numa operação real, ou de alto risco, ou que nem mesmo conseguem lembrar da última vez que realizaram algum treinamento de tiro. E mesmo que queiram fazê-lo por conta própria e em local seguro, mas que não seja autorizado pelo Poder Público como atividade específica para aquele fim, então, poderão ser processados e julgados por disparo de arma de fogo: crime!
Mas em relação aos fora da lei e pelo fato de não necessitarem de porte de arma de fogo, pois utilizam naturalmente quaisquer tipos de armamentos e andam tranquilamente aterrorizando a população, através do uso de fuzil, pistolas, metralhadoras, granadas e etc. E até podem subornar um policial corrupto, a fim de não ser preso, e neste caso já possuem um bom porte federal de arma de fogo e de uso restrito, qual seja? O dinheiro!
E a população, como fica nessa história? Totalmente desprotegida, pois na maior parte do Brasil, e inclusive na Região Metropolitana de todos os Estados, não existe um bom serviço de policiamento ostensivo, ficando a população entregue a própria sorte e sobre a misericórdia de Deus!
E o governo, o que faz? Mais um mutirão para desarmar a população, como se o bandido fosse comprar arma de fogo de maneira legal. E tem mais? Será que o governo está preocupado com algum acidente de arma de fogo, crime passional ou algum besteira que alguém possa fazer? Penso que não! Primeiro que a saúde pública está um caos; o saneamento público, uma porcaria, o combate ás drogas, um fracasso; o combate aos criminosos, também um fracasso e por aí vai. E em segundo lugar, é que não se precisa de arma de fogo para fazer besteira, pois qualquer objeto pode ser utilizado para a prática de um crime!
Então, essa PEC 358/05 é uma grande ilusão, visto que não pretende mudar significativamente NADA!
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Vlad, o CPC não já traz previsão da súmula impeditiva? Seria agora também para a esfera penal? abrs
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O art. 518, §1º, o art. 543-C e o art. 557 do CPC tratam do tema e se assemelham à súmula impeditiva de recursos. O primeiro artigo só se aplica às apelações cíveis. O segundo vale para qualquer recurso especial em caso de matéria repetitiva. O terceiro é mais parecido com a PEC, mas esta tem escopo mais amplo e pretende resolver o problema da constitucionalidade. Veja o art. 105-A da PEC 358/05.
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