Adam Kaufmann, ex-promotor de Nova Iorque


Emblema da Promotoria de Nova Iorque
Emblema da Promotoria de Nova Iorque

A Promotoria nova-iorquina, retratada na série Law and Order, perdeu o seu “Michael Cutter” da área de crimes financeiros.O promotor Adam Kaufmann, que muitos delegados, juízes e colegas de Ministério Público conhecem, desligou-se do District Attorney of New York (DANY).

Depois de 18 anos como um dos membros mais atuantes do Escritório do D.A. de Nova Iorque, Kauffmann deixa de ser um prosecutor para abrir um escritório em NY especializado em recuperação de ativos e criminal compliance nas áreas de corrupção e lavagem de dinheiro. Kauffmann será sócio de Arthur Middlemiss, outro ex-promotor nova-iorquino. Sua nova firma tem sedes em Washington e Nova Iorque.

Caminho semelhante (indo de um órgão público para a iniciativa privada) foi seguido no Brasil pelo ex-advogado da União, Antenor Madruga, que, à frente do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) do Ministério da Justiça, foi o responsável pela estruturação da Enccla, uma das mais exitosas políticas públicas brasileiras contra a criminalidade.

Em 2009, ao final da memorável gestão de Robert Morgenhtau como D.A. de Manhattan (foi reeleito consecutivas vezes de 1974 até sua aposentadoria naquele ano), Adam Kaufmann e a Procuradoria dos Estados Unidos conseguiram um acordo histórico (aqui) que forçou o Credit Suisse a pagar 536 milhões de dólares para encerrar uma investigação por crimes financeiros relacionados à violações de sanções econômicas impostas ao Irã (aqui). Aqui vale um parêntese. Estes acordos chamados deferred-prosecution settlements evitam a propositura de ações penais. Os valores obtidos com tais TACs criminais normalmente são partilhados entre a Promotoria, a Cidade de Nova Iorque e o Estado.

banestadoRegistro a saída de Adam Kauffman porque ele ajudou enormemente o Brasil em vários casos criminais de grande relevância. Cito três: Banestado (PR), Maluf (SP) e Mensalão (DF). Mas há mais! Procuradores, promotores, juízes e delegados de Polícia de todo o Brasil devem lembrar-se dos incontáveis procedimentos de cooperação internacional em matéria penal nos quais ele prestou assistência ao Brasil para a persecução criminal de graves crimes financeiros, corrupção e lavagem de dinheiro.

Para quem não sabe, Kauffman foi responsável por obter a ordem de prisão internacional – difusão vermelha ou red notice (aqui) que impede Paulo Maluf de sair do Brasil, e pela entrega de documentos fundamentais para os processos estaduais e federais contra o ex-prefeito, ora deputado.

Sob sua condução, a Promotoria de Nova Iorque cooperou com o Ministério Público de São Paulo na investigação contra membros da Igreja Universal do Reino de Deus.

Foi Kauffmann quem auxiliou o Brasil a obter documentos indispensáveis para a realização da Operação Farol da Colina (mais de 60 doleiros presos) e para alcançar dezenas de condenações que resultaram do escândalo Banestado (1996-2002), até aqui um dos maiores casos de evasão de divisas e lavagem de dinheiro da história do País.

Foi ele quem propiciou os meios para que o Ministério Público Federal conseguisse o bloqueio de expressivos valores nos Estados Unidos e depois os repatriasse na Operação Zero Absoluto. Graças a ele, à procuradora federal Marion Percell (USAO/NJ) e ao agente Thomas Drombrowski (DHS/ICE), US$3.600.000,00 voltaram aos cofres nacionais.

Foi ele quem ajudou o MPF e a PF a coletar documentos que serviram de base para a RFB realizar lançamentos tributários de mais de R$ 8 bilhões, um resultado maiúsculo da Força-Tarefa do Banestado e do Fisco.

Várias autoridades brasileiras – como os juízes Sergio Moro e Fausto de Sanctis, os procuradores Edson Almeida, Rodrigo de Grandis e Lauro Cardoso, o promotor de Justiça Sílvio Marques, os DPFs Erika Marena, Luciano Flores e Paulo Roberto Falcão -, lembrarão de outros tantos auxílios prestados por Kaufmann a investigações criminais do Brasil. Leia aqui a entrevista que ele concedeu à Folha de São Paulo em 2009.

Por tudo isto, Adam Kaufmann mereceria a medalha do Ministério Público. Na verdade, talvez por justiça, merecesse uma comenda do Estado brasileiro. Fica, pelo menos, este agradecimento público.

4 comentários

  1. Merecida homenagem, Dr. Vladimir!!!
    Parabéns pelo texto e reconhecimento ao Adam K. Concordo com tudo!
    Abs

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  2. Caro Dr. Vladimir,
    Os seus artigos têm me produzido enorme satisfação, principalmente pelo equilíbrio das suas ponderações e pela profundidade que os temas são tratados. Sinceramente, lhe felicito pela clareza mental, pela sua inegável cultura e também pela generosidade com que compartilha tão valioso conhecimento. Não cheguei a terminar o curso de Direito, pois decidi trilhar o estudo da Economia e de questões relacionadas às Finanças Internacionais e Agricultura. Não obstante, sempre me interessei muito pelo assunto “Lavagem de Dinheiro”, em parte por haver tomado um enorme susto no passado de quase ter sido envolvido numa transação obscura quando me encontrava trabalhando para uma Multinacional no exterior. Na época recém falava-se da necessidade dos departamentos de Compliance. Felizmente, o caso não passou de uma tentativa que foi rapidamente detectada e evitou que o desconhecimento me tornasse Réu numa causa dessa natureza. Depois disso, tratando de evitar que situações dessa ordem se repetissem, passei a estudar essa matéria com muito interesse, porém de maneira informal. Li muito a respeito do trabalho do Dr. Robert Morgenthau e acho que ele realmente merece todo o reconhecimento manifestado em seu Post. Tenho acompanhado atentamente as suas abordagens acerca do tema Lavagem de Dinheiro e lhe digo que é um orgulho saber que existem profissionais como o Senhor trabalhando no Ministério Público, o que faz a gente pensar que ainda há esperança de que o País melhore conduzido por pessoas de qualidade intelectual e moral como a sua. Para finalizar, apesar dos vários acertos do Ministro Joaquim Barbosa a frente da relatoria do caso do Mensalão, me parece que o fato do núcleo político não ter sido condenado pela prática do Crime de Lavagem de Dinheiro foi uma enorme falha técnica e, talvez, permita que se estabeleça um grave retrocesso na aplicação da Lei. No meu entendimento, a essência do negócio de natureza “Corrupta” é a ocultação de bens e valores, pois não imagino que o ex-Ministro José Dirceu tenha declarado em seu Imposto de Renda aquilo que auferiu como resultado de todos os crimes que lhe condenaram. Me despeço, reiterando meus votos de admiração e apresso pelo valioso trabalho que o Senhor desenvolve.

    Abraço

    Eduardo Lima Porto
    Porto Alegre/RS

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