Quinta crítica: é inconstitucional o instituto da colaboração premiada


Essa é uma das críticas mais frágeis. Haveria inconstitucionalidade apenas porque o comentarista assim o deseja?

Haveria violação da legalidade? O instituto está na lei há mais de duas décadas e agora, com a Lei 12.850/2013, seu procedimento foi milimetricamente regulado.

Haveria violação à ampla defesa? O colaborador, que é o principal interessado nos acordos penais, participa deles com a assistência de seu defensor. Os corréus atingidos pela colaboração também atuam em juízo assistidos por seus advogados.

Haveria violação ao contraditório? Tão logo a denúncia é apresentada em juízo, o acordo de colaboração se torna público, a fim de assegurar o julgamento justo (fair trial), ressalvadas apenas as diligências investigativas em execução, nos exatos termos da Súmula Vinculante 14. Na fase judicial, o acesso ao acordo é pleno e as defesas por ele atingidas podem manejar diversos instrumentos processuais para garantir o devido processo legal.

Para o ex-ministro do STF Ayres Brito, a colaboração premiada é constitucional, pois a ferramenta se situa no contexto da segurança pública, ao mesmo tempo dever do Estado e direito da sociedade (STF, 1ª Turma, HC 90.688/PR, rel. min. Ricardo Lewandowski, j. em 12/02/2008).

No caso Lavajato, entre dezembro de 2014 e maio de 2015, o ministro Teori Zavascki, do STF, homologou três acordos de colaboração premiada, firmados por Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef e Rafael Ângulo Lopes, com base na Lei 12.850/2013. Nenhum dos acordos foi reputado inconstitucional.

O único ponto que merece maior atenção é o da cláusula, existente em alguns acordos, que acarreta a renúncia (waiver) ao duplo grau de jurisdição e ao uso do habeas corpus. Obviamente, essa obrigação do colaborador não pode ser genérica a ponto de inviabilizar sua defesa nos tribunais de apelação ou nas cortes superiores, caso ocorra nulidade processual ou violação de suas garantias fundamentais, para além dos limites do negócio processual.[1] Cláusulas desta ordem devem ser examinadas com cautela pelo juiz competente para a homologação e podem ser submetidas a glosa, na forma do artigo 4º, §§7º e 8º, da Lei:

§7º. Realizado o acordo na forma do § 6o, o respectivo termo, acompanhado das declarações do colaborador e de cópia da investigação, será remetido ao juiz para homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade, podendo para este fim, sigilosamente, ouvir o colaborador, na presença de seu defensor.

§8º,  O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais, ou adequá-la ao caso concreto.


[1] Vide, a propósito, o artigo 190 do novo CPC (Lei 13.105/2015), que entrará em vigor em 2016. A regra trata dos negócios processuais. Tal dispositivo poderá ter efeitos no processo penal? “Art. 190.  Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. Parágrafo único.  De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.

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