Pai não é padrasto


Se você não estava em Marte nos últimos dias, sabe que esta semana o País ficará vidrado nos detalhes do júri do caso Isabela Nardoni. Seu pai e sua madrasta serão julgados pelo júri popular em São Paulo, a partir desta segunda-feira 22/mar. Os advogados Roberto Podval (doze júris na carreira) e Roselle Adriane Soglio (experiência em seis júris) enfrentarão na tribuna o promotor de Justiça Francisco Cembranelli (1.075 júris na carreira). Na assistência à acusação, atuará a advogada Cristina Christo, representando a mãe de Isabela. 

Depois de vários habeas corpus denegados, está tudo pronto para o julgamento. Contudo, a sessão poderá ser adiada. Os advogados podem simplesmente deixar de comparecer ao tribunal (art. 456), com ou sem justificativa. Além disso, a defesa pode insistir na ouvida de uma testemunha, o pedreiro Gabriel Santos Neto. Entrevistado pela Folha de S. Paulo, Neto afirmou que um ladrão teria arrombado uma obra vizinha ao prédio de onde a menina caiu. Se esta testemunha tiver sido declarada imprescindível pela defesa, ela poderá ser conduzida coercitivamente ao plenário. Se não for encontrada, o júri será postergado. Está no código:  

Art. 461.  O julgamento não será adiado se a testemunha intimada deixar de comparecer, salvo se uma das partes tiver requerido a sua intimação por mandado, na oportunidade de que trata o art. 422 deste Código, declarando não prescindir do depoimento e indicando a sua localização“.     

Publicidade versus presunção de inocência 

O interesse da imprensa e da população em geral sobre o julgamento tem sido imenso. Infelizmente, o juiz Maurício Fossen não autorizou a realização de imagens da sessão, que ocorrerá numa sala de dimensões reduzidas. Os veículos de comunicação não poderão gravar o julgamento. Um pedido da  Associação dos Advogados Criminalistas do Estado de São Paulo (Acrimesp) foi indeferido. É uma pena que isso tenha ocorrido. A memória de uma sessão plenária como esta deveria ser inteiramente preservada, em áudio e vídeo. Bastaria ao juiz proibir a tomada de imagens dos réus, dos jurados e das testemunhas que assim o desejassem.

Fonte: O Globo

A regra no Judiciário é a da publicidade dos julgamentos (art. 93, IX, da Constituição). Até as sessões do Supremo Tribunal Federal são transmitidas ao vivo. Por que se impediria a gravação de uma sessão do tribunal popular? No particular, a Constituição só determina o sigilo “das votações” do júri (art. 5º, XXXVIII, letra ‘b’). Logo todos os demais atos são públicos, não havendo lesão à presunção de inocência dos acusados, uma vez que os jurados permanecerão incomunicáveis. Quanto maior a publicidade, maior a legitimidade do julgamento. De todo modo, diante da existência de inúmeros dispositivos de captação de som e imagens, será difícil para o juiz presidente assegurar o cumprimento dessa proibição. Não creio que ele terá controle sobre todos os gadgets em plenário, inclusive aqueles minúsculos, facilmente ocultáveis.  

Teses no plenário 

Se tudo der certo, o conselho de sentença será formado e a instrução plenária se iniciará ainda na segunda-feira. A tese do Ministério Público é conhecida: homicídio doloso triplamente qualificado (pena de 12 a 30 anos) com a majorante do art. 121, §4º do CP (crime cometido contra menor de 14 anos). O promotor Cembranelli poderá sustentar agravantes (arts. 61 e 62 do CP). O júri também analisará a acusação conexa de fraude processual (art. 347, parágrafo único, CP), que é sancionada com pena de 6 meses a 4 anos de detenção.   

Quanto à tese da defesa, suponho que os advogados do casal Nardoni adotarão duas linhas. A primeira será a negativa de autoria. Tentarão atribuir a uma terceira pessoa a prática do crime. Para isso, o depoimento da testemunha Gabriel Santos Neto é fundamental. Se os jurados reconhecerem que o crime não foi praticado pelos Nardoni, eles estarão absolvidos.    

A segunda tese da defesa, a ser utilizada alternativamente, é a da imprestabilidade das provas para a condenação. Os defensores poderão sustentar que não há provas suficientes para condenar o casal pelo crime de homicídio. Para isso, a estratégia exigirá ataque firme aos exames periciais realizados pelos médicos legistas e pelos peritos criminalísticos da polícia científica de São Paulo. A defesa apostaria na dúvida dos jurados, segundo o critério in dubio pro reo, o que resultaria em absolvição. Esta tese é mais útil à madrasta do que ao pai da menina.        

Isabela tinha 5 anos quando foi lançada, talvez ainda viva, do alto do sexto andar de um prédio na zona norte de São Paulo. Sete cidadãos paulistanos vão dizer se A.N. agiu como pai ou como um mau padrasto.

4 comentários

  1. Pena que apos o termino do jugamento nao teremos imagens.Esperos que os jugados sejam condenados e pagem pelo seu crime.

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  2. Concordo, a mídia manda !!
    Prova maior não há, é mais do que certo que o pai jogou a garota pela janela !!
    A madrasta induziu e é cúmplice do ato do pai !!
    Como é visto esse ato ??
    Se a Jatoba for considerada inocente, ela “ainda” pode processar o estado, por ter ficado presa ??

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  3. Muito bom artigo, esclarecedor e imparcial.
    Todos querem que o(s) *culpado(s)* seja(m) identificado(s) e condenado(s), mas condenar inocentes é cruel e vergonhoso para a justiça e para a sociedade.
    Não tive acesso aos autos, mas acredito que não há *provas* para condena-los nem para inocenta-los, e ocorrerá o in dubio pro reu.

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